Caco Barcellos e André Rizek falam sobre a experiência na carreira e como superar as inseguranças da profissão
Se você pensa em fazer Jornalismo, é provável que alguém já tenha lhe perguntado: “Mas ainda tem mercado para isso? Será que dá dinheiro?”. Se não ouviu, é possível ainda que tenha feito a si mesmo essa pergunta - e muitas outras. “Vou conseguir trabalhar na editora ou na emissora que quero? Vou conseguir ser tão bem sucedido quanto aquele jornalista famoso que eu admiro? Será que eu preciso mesmo do diploma para me dar bem?”.
Antes de tudo, é preciso lembrar que as dúvidas são naturais e muito saudáveis em um processo de escolha de profissão. No entanto, se você sentir que o Jornalismo pode ser o seu caminho, saiba que ele pode ser difícil, mas muito recompensador. Foi isso o que defenderam os jornalistas Caco Barcellos e André Rizek em suas palestras na Feira Guia do Estudante 2014, realizada no fim de agosto.
André Rizek e o mundo do Jornalismo esportivo
Divulgação |
O jornalista esportivo André Rizek, de 39 anos, é apresentador do programa Redação SporTV e já foi chefe de redação da emissora em São Paulo. Ele, que entrou na faculdade em 1993, diz que decidiu prestar Jornalismo em cima da hora e considera que teve uma formação fraca. “Sou pessoalmente contra a obrigatoriedade do diploma. Temos grandes jornalistas, como o Juca Kfouri, que não são formados no curso”, diz.
Como muitos estudantes da área, André achava que trabalharia com cultura. “No começo, eu achava que seria um grande intelectual da imprensa. Acabou que só trabalhei um mês com cultura e logo pulei para esporte”, conta ele, que participou da cobertura de três Copas do Mundo. Além de ter trabalhado na revista Placar e no SporTV (onde está até hoje), também foi repórter de política na revista Veja, para a qual fez várias reportagens como jornalista investigativo. Em 2005, assinou a matéria de capa na revista sobre a “Máfia do Apito”, que lhe rendeu grande prestígio e alavancou seu nome. “O plano de carreira no Jornalismo é muito confuso. O repórter cresce de acordo com as reportagens de peso que escreve, o que dá credibilidade e faz com que as oportunidades surjam”, explica. Depois da reportagem, os convites para trabalhar na televisão começaram a surgir.
Embora o jornalismo esportivo atraia muitas pessoas que gostam de esporte, mas não pretendem se tornar atletas, esse não é o caminho recomendado para torcedores muito ardorosos de um time. “O jornalista esportivo tem que estar preparado para se emocionar com a história do seu rival também. Quando o Brasil perdeu para a Alemanha na Copa, o repórter que fez a cobertura teve que engolir a emoção e contar o porquê do sucesso da Alemanha”, diz, contando que ele mesmo teve o seu momento de fraqueza, quando o Brasil perdeu para a França na final da Copa de 1998. “Você pode ser santista, corinthiano, flamenguista, o que for. É preciso se perguntar: terei a frieza de contar a história do meu rival? Se não, é melhor procurar outra profissão.”
Por outro lado, engana-se quem pensa que o trabalho do jornalista esportivo se resume a coberturas de jogos. O Jornalismo em si é uma profissão bastante versátil, e no esportivo não seria diferente. Se algum jogador for pego em um exame antidoping, o jornalista deve estar preparado para falar sobre a droga específica e o seu efeito. Se houver algum escândalo de corrupção com algum juiz, o jornalista vai fazer uma cobertura semelhante à que faz um repórter de política.
Além disso, os próprios países-sede dos eventos também podem render bastante pauta. “Quando eu cobri a Eurocopa da Polônia, em 2012, o país estava enfrentando uma série de conflitos com os russos. Não tinha nada a ver com esporte, mas tínhamos que estar preparados para contar aquela questão diplomática”, explica Rizek. “As informações precisam ser contextualizadas. Não podemos só falar do jogo. Temos que mostrar o país que está sediando e como são as pessoas que vivem por lá”, diz.
Outra questão é o machismo ainda fortemente impregnado no mundo esportivo. Se há poucas mulheres atuando na arbitragem do futebol masculino, é quase possível dizer o mesmo do jornalismo esportivo. Rizek, no entanto, acredita que a situação já foi muito pior para as jornalistas da área. “Apesar de elas não apareceram tanto na linha de frente quanto os homens, os bastidores das redações já têm bastantes jornalistas mulheres”, conta, apesar de ressaltar que a situação, mesmo que melhor, ainda está longe do ideal.
Problemas à parte, ele se diz apaixonado pelo que faz. “O legal do Jornalismo é não ter rotina. Cada dia você pode fazer alguma coisa diferente, entrevistar pessoas diferentes. O mais importante é gostar muito de contar histórias.”
Caco Barcellos ensina como vencer a insegurança
O veterano Caco Barcellos tem um currículo invejável para qualquer jornalista. Aos 64 anos, é um dos grandes nomes do jornalismo investigativo no país, autor de três livros - um deles, o famoso “Rota 66, a história da polícia que mata” - e vencedor de dois prêmios Jabuti de literatura. Também é um dos repórteres mais famosos da Rede Globo e recebeu vários prêmios por sua atuação em defesa dos direitos humanos.
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Por incrível que pareça, o apresentador do programa Profissão Repórter compartilha um dos medos de todo repórter iniciante: o de fracassar. “Eu tenho um medo muito forte, ainda hoje, de não conseguir fazer o trabalho que vou fazer amanhã, ou depois.” Ele diz que sempre se sentiu um “cidadão de quinta categoria”, mas deu a “sorte” de ser persistente. “Nunca me entreguei. Não posso te dizer se as coisas que fiz foram boas ou ruins, mas te garanto que, em tudo o que fiz, me dediquei ao máximo.”
Caco atribui essas inseguranças às suas origens: cresceu na periferia de Porto Alegre e teve que trabalhar para conseguir estudar. Enquanto fazia faculdade, trabalhou como taxista para poder pagar as contas até conseguir ser contratado como repórter. “Sempre me senti um desqualificado por conta da minha formação, das minhas dificuldades materiais, por ter estudado nas piores escolas. Hoje eu acredito que, provavelmente, foi essa formação simples que me ensinou a lutar. O que eu achava que era motivo para me sentir um fraco, foi talvez o que me deu mais força”, conta.
Sua experiência é válida especialmente para estudantes que precisam trabalhar e estudar e se sentem deixados de lado por não conseguir se dedicar exclusivamente ao curso. “Acho compreensível que essas pessoas se sintam em condição inferior. É o caso de ver o mundo com outro olhar: eu sou corajoso, eu sou forte, eu sou persistente. Eu mesmo construo o meu destino e posso ser mais forte do que aqueles que têm um privilégio que eu não tenho”, diz.
Se você quer ser jornalista mas acha que jamais vai conseguir chegar a ser um profissional reconhecido, Caco explica que é importante conhecer as dificuldades pelas quais passaram os repórteres bem sucedidos. “Não é só pegar o microfone e aparecer diante da câmera em uma emissora de grande alcance. A trajetória começa muito mais embaixo. Tem gente que percorre um caminho mais duro do que o outro, mas nunca é um mar de facilidades”, explica.
Por trabalhar com jovens jornalistas, no Profissão Repórter, ele diz reconhecer facilmente um apaixonado pela profissão. “No meio de uma multidão de pessoas talentosas, sempre vai ter um que é mais dedicado e esforçado do que os outros. É aquele ali que você nota que tem garra, que ama o que está fazendo, e não necessariamente esse cara é o que tem a melhor formação.”
É essa paixão que, de acordo com ele, o levou onde está. “Eu li quase 40 vezes o livro “A sangue frio”, do Truman Capote, para aprender com ele. Me intrigava o jeito com que ele terminava cada capítulo, sem nunca repetir o formato, mas sempre conseguindo fisgar o leitor. Tentei reproduzir isso nos meus livros também. Não sou um gênio, nem inteligente, mas sou persistente e não desisto”, diz. Mas, e quem não tem confiança ou sente que não tem a capacidade para ter essa mesma persistência? Para estes, seu recado é também muito simples. “Busque a sua história, não tenha medo. E, se tiver medo, agarre-o. Aprenda com ele.”
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