Enfim, reconhecidos
Dois elementos químicos artificiais e radioativos, o 114 e o 116, são incorporados à tabela periódica. A fabricação dessas partículas acelera a corrida pela criação de átomos mais estáveis que poderiam ser usados para geração de energia.
Por: Sofia Moutinho
Os mais novos integrantes da tabela periódica – que ocupam as casas 114 e 116 – ainda não foram oficialmente batizados. Por enquanto, são chamados pelos termos em latim para seus números atômicos: 'ununquadium' e 'ununhexium'. (montagem: Sofia Moutinho)
A tabela periódica vai ganhar mais dois elementos. O 114 (ununquadium, em latim) e o 116 (ununhexium, em latim) foram reconhecidos esta semana pela União Internacional de Química Pura e Aplicada (Iupac, na sigla em inglês), depois de três anos de avaliação pelo comitê de cientistas Joint Working Party on Discovery of Elements.
Os dois elementos não são encontrados na natureza e foram criados no Joint Institute for Nuclear Research em Dubna, na Rússia, e no Laboratório Nacional Lawrence Livermore, nos Estados Unidos, por meio da colisão de átomos em alta velocidade.
Os dois elementos não são encontrados na natureza e foram criados por meio da colisão de átomos em alta velocidade
“É muito provável que esses poucos átomos criados artificialmente sejam os únicos desses elementos que já existiram sobre a crosta terrestre”, avalia o engenheiro químico José Alberto Bonapace, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).
Desde 1999, muitas equipes de pesquisadores já vinham anunciando a criação do 114 em laboratório. Mas até hoje nenhum desses estudos isolados havia sido repetido para provar a sua validade.
Apenas agora a Iupac reconheceu o feito, obtido pela colaboração entre os grupos da Rússia e dos Estados Unidos, que conseguiram repetir a experiência em dois laboratórios diferentes, em 2004 e 2006, e provar a criação não só do 114, como também do 116.
“O custo para manter esses laboratórios é muito grande, eles consomem energia suficiente para alimentar uma cidade do tamanho de Niterói”, comenta Bonapace. “Para que esse gasto se justifique, a busca por novos elementos é concorridíssima.”
Colisão de átomos
Para criar o 116, os cientistas usaram um acelerador de partículas para lançar um átomo de cálcio, que tem 20 prótons, contra um átomo de cúrio, que tem 96 prótons. Já para chegar ao 114, a ‘soma’ feita foi de um átomo de cálcio (20 prótons) com um de plutônio (94 prótons).
Os novos elementos são agora os mais pesados da tabela periódica já reconhecidos. Ambos são radioativos e só se mantêm por menos de um segundo até começar a decair, ou seja, perder partículas do núcleo e se transformar em outros elementos mais leves. O 114, por exemplo, se transforma em copernicium (112) meio segundo depois de sua criação.
Bonapace explica que, em geral, os átomos artificiais – chamados de transurânicos, por se situarem depois do urânio (que tem número atômico 92) na tabela periódica – têm um tempo de vida muito curto.
A única exceção é o plutônio-239, que leva mais de 24 mil anos até se transformar em outro elemento, o urânio-235. Produzido como resultado da queima do urânio, o plutônio-239 é uma espécie de lixo das usinas de energia nuclear.
Ilha de estabilidade
Os cientistas acreditam que a produção desses novos elementos é um primeiro passo rumo à criação de novos átomos artificiais mais estáveis, capazes de se manter em sua forma original por décadas.
Bonapace conta que químicos e físicos especulam a existência da chamada “ilha de estabilidade”, uma região da tabela periódica, depois do número atômico 118 (o último da tabela atual), em que os elementos químicos artificiais seriam mais estáveis. Esses elementos poderiam se manter por horas, meses ou até mesmo décadas sem decair.
O engenheiro químico comenta que uma das aplicações desses átomos estáveis seria a geração de energia nuclear. “O urânio um dia vai acabar e esses elementos seriam uma alternativa para a produção de energia elétrica”, aponta.
Como a quantidade de átomos produzidos foi muito pequena, nem mesmo seus criadores sabem quais são as suas propriedades
No entanto, o pesquisador ressalta que ainda não é possível afirmar que os elementos teriam realmente essa aplicação. “O uso deles ainda é uma incógnita”, diz. “O bromo, por exemplo, era usado para melhorar a qualidade da gasolina, mas ele era muito poluente e hoje é usado para fazer corantes. Já o urânio pode tanto ser usado para fabricação de armas nucleares quanto para geração de energia elétrica. Tudo depende da demanda.”
O destino dos elementos 114 e 116 é ainda mais incerto. Como a quantidade de átomos produzidos foi muito pequena, nem mesmo seus criadores sabem quais são as suas propriedades. Por enquanto, resta a eles dar nome próprio aos novos elementos. A tradição sugere que serão escolhidos nomes de cientistas para batizá-los. Façam suas apostas!
Sofia Moutinho
Ciência Hoje On-line
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